No dia 13 de julho de 2009, Valdenir Benedetti deixou este mundo para viver entre as estrelas, talvez seu ambiente mais familiar. Porém aqui permanece imortalizado pela sua maneira de pensar e ensinar a astrologia. Muito amado por muitos, deixou uma marca indelével em seus alunos e em todos os astrólogos que com ele conviveram e que reconheceram nele um renovador da nossa arte de interpretar os céus. Como acontece a todos os que ousam transgredir, questionar e inovar, também teve lá seus desafetos, faz parte... Por sorte deixou inúmeros textos, alguns publicados outros não. Este blog foi criado para que todo o seu pensamento fosse acessível tanto aos que o conheceram quanto aos que, ao longo de seu aprendizado da Astrologia, com certeza dele ouvirão falar.



"Há pessoas que nos falam e nem escutamos, há pessoas que nos ferem e nem cicatrizes deixam, mas há pessoas que simplesmente aparecem em nossas vidase nos marcam para sempre."

Cecília Meireles







26.6.10

O MEDO

A idéia de “medo” para a astrologia está tradicionalmente relacionada ao planeta Saturno. Na verdade, a expressão do medo atribuída a Saturno tem um fundamento: por ser o último planeta visível, dentro do modelo de elaboração de significados planetários baseado na simples analogia da correlação entre os ritmos e movimentos da natureza externa com a natureza interna do ser humano, o ultimo ponto visível exterior ao homem, passa a representar o ultimo ponto atingível dentro do próprio homem, o limite, a fronteira final, isto partindo do pressuposto de que o ser encarnado só pode chegar até onde ele pode ver, pois o que está além do visível é o mistério, é o desconhecido. É natural temer aquilo que não conhecemos. É bastante humano e até mesmo instintivo e biológico não aceitar qualquer coisa que represente uma possibilidade de perder o controle, pois isto pode ser uma ameaça à vida e à continuidade da espécie. E tudo o que não conhecemos é, simbolicamente, aquilo que está além do visível, além da estrutura conhecida, além de Saturno, enfim. Através desse raciocínio percebemos que Saturno não representa propriamente o medo, mas a fronteira entre o conhecido e o desconhecido, entre aquilo que é controlável e adaptável às nossas estruturas e aquilo que pode representar o caos e a diluição destas estruturas. O medo é o reconhecimento daquilo que está além de Saturno, além do visível e, portanto Saturno representa apenas à fronteira, o limite, a barreira entre aquilo que não nos assusta, a princípio e aquilo que não podemos controlar que não conhecemos e, portanto devemos temer. Podemos ousar concluir que Saturno não representa propriamente o medo, mas a divisão entre a realidade administrável e a realidade desconhecida e ainda não experimentada; a fronteira entre aquilo que podemos manipular conscientemente, e os níveis da consciência que ainda não conseguimos acessar. Isto muda tudo!

Este raciocínio exige de nós uma revisão dos significados e aplicações de Saturno, se por acaso concordarmos com ele, se por acaso nos atrevermos a redefinir os conceitos tradicionais deste planeta e, em vez de Saturno simplesmente representar uma qualidade ou característica do ser, o medo, ele passa a representar dinamicamente o que poderíamos chamar de “ponto de refluxo da consciência”, ou seja, a barreira na qual o fluxo da energia vital, representada pela expressão consciente do ser, esbarra e volta para o centro, exatamente como as ondas de energia concêntricas emanadas de um objeto atirado na água, que em certo momento esbarram na borda do recipiente que contém esta água e reiniciam um movimento para o centro. A redução e simplificação dessa dinâmica ao substantivo medo, é uma adaptação relativamente facilitadora do processo, uma maneira de administrá-lo reduzindo-o a lugares comuns.

É muito fácil pensar em medo como um conteúdo inerente ao ser, um objeto, algo que se possui ao nascer ou se adquire durante a vida. É mais trabalhoso entender essa palavra como significadora de limites a serem superados para que nossa energia vital se expanda e percorra outras dimensões do universo, pois esse modo de entender a palavra implica em ação, em atitude, em enfrentamento.

Além do que, observa-se com freqüência, uma tendência irresistível - própria do pensamento analítico contemporâneo -, de reduzir tudo a mínimos denominadores comuns, como fórmula de manter o controle sobre as coisas todas. O homem prefere muitas vezes adaptar as experiências maiores da vida, - aquelas que dependam de ousadia, transformação e libertação - , à sua realidade tacanha e a seu raciocínio tosco e preguiçoso, inclusive muitos de nós astrólogos.

O que é o contrário do medo? Coragem? Bem, essa seria uma resposta um tanto banal e imediata, que independe de um raciocínio mais apurado. Mas talvez seja a resposta mais certa. Coragem é uma bela palavra, mas preferimos expandir essa questão e caminhar para além do lugar comum, ou talvez tentar entender o que é a coragem, como ela está relacionada com o significado de Saturno que propomos acima.

Jean Yives Leloup propõe que o oposto ao medo é o desejo. Afirma em seu trabalho “A escada do desejo e do medo” que: “É bom lembrar que o homem evolui através do desejo e do medo. Não há medo sem um desejo escondido e não há desejo que não traga consigo um medo. O desejo e o medo estão ligados. Temos medo do que desejamos e desejamos o que nos faz medo”.

O entendimento do que se opõe ao Medo, - enquanto um significado possível de Saturno, pode ser compreendido através de sua inclusão à geometria estrutural do horóscopo, pois o representante da dinâmica do medo, Saturno, se opõe tecnicamente, como regente diurno de Capricórnio e noturno de Aquário aos luminares, Lua e Sol, respectivamente regentes de Câncer e Leão, signos que são opostos complementares de Capricórnio e Aquário. Precisamos analisar cuidadosamente e gradativamente esta oposição e suas derivações para que a idéia traga alguma luz à nossa consciência, acrescente. Vamos trabalhar aqui especialmente com a oposição simbólica entre Saturno e Lua, entre o limite simbolizado pelo planeta Saturno e a essência feminina do ser simbolizada pela Lua. A compreensão do medo é fundamental para superarmos o medo, a compreensão dos limites é essencial para ultrapassarmos os limites, e neste momento a astrologia e o horóscopo individual se apresentam como ferramenta útil e afiada para encontrarmos os caminhos e a coragem para irmos além das fronteiras do que nos é permitido pelos limites culturais.

1 - Saturno rege dois signos de “elevação”, signos da metade superior do horóscopo, do hemisfério que representa o caminho diurno do Sol, portanto, por analogia, a consciência e o mundo externo. Podemos conjeturar que os limites simbolizados por Saturno se vinculam à realidade externa do ser, ao mundo social e à atividade consciente e objetiva, ou a uma experiência ligada à sociedade e à consciência mais que ao mundo interior e aos conteúdos e potencialidades inconscientes ou “noturnas” do indivíduo.

2 - A oposição entre Saturno/Capricórnio e a Lua/Câncer inicia e propicia a compreensão do mecanismo de complementaridade entre o medo e a coragem, entendendo aqui a coragem como um movimento em direção à geração da vida e à sua continuidade, coerentes com o que a Lua simboliza. Saturno simbolizando o mecanismo do medo como expressão do medo de superar limites, e a Lua simbolizando o mecanismo mantenedor da própria vida, biológica e psicológica, a necessidade de viver e a coragem necessária para isso.

3 - A Lua, como significador astrológico da preservação da vida (por isso a reprodução e seus mecanismos), é responsável pelo medo biológico da destruição e da interrupção da vida, medo da morte ou desejo de continuidade.

O medo biológico e natural de perder a vida e o desejo também natural de viver plenamente, de estar presente, tem como oposto complementar o planeta Saturno, regente natural dos signos opostos aos regidos pelo Sol e pela Lua, funcionando, portanto como complemento e contraposição ao medo e ao desejo; sendo a referencia em alguns casos e a sombra em outros destas faculdades e deste movimento da própria vida, e por isso é atribuído a ele, Saturno, a responsabilidade pelo medo, pela morte, pela interrupção da vida, por todas as incertezas que nos assombram e exigem um confronto nosso com o real, com o externo, com aquilo que faz na verdade funcionar o fluxo energético entre o Sol e a Lua.

4 - Dentro da proposta de considerar que o momento do nascimento é representado astrologicamente pelo grau do signo Ascendente e, portanto este ponto específico do horóscopo é quem determina esta primeira etapa, e é também onde se concentram este medo da morte e do desconhecido e esse desejo da vida. O nascimento e suas condições são muito bem representados pelo signo ascendente, seu regente e o planeta que porventura esteja na primeira casa. Daí que a qualidade e a natureza deste impulso, de certa forma pode ser descrita pelo signo Ascendente. Então, este impulso em direção a vida seguirá a direção marcada por este primeiro signo, e o medo de morrer também encontrará neste ponto sua referencia final, pois este ponto inicial da circunferência é também o ponto final. Mas os mecanismos objetivos, a forma através da qual exteriorizamos e reagimos ao medo e ao desejo são representadas pelos planetas que analisamos acima, Sol, Lua e Saturno, e é neles que concentraremos nossa análise, sem descartarmos evidentemente outros significadores que os complementem. Podemos considerar neste momento o quanto o Desejo e o Medo afetam nosso projeto de vida, como estes dois sentimentos essenciais modulam, dirigem, administram, distorcem, e entopem, as vezes, o desenvolvimento livre do projeto, da finalidade maior da vida que é representada pelo signo e pelas condições do ascendente. Quantas vezes a gente não se pergunta coisas do tipo “mas estava indo tudo direitinho, o que aconteceu que de repente tudo desmoronou?”, ou “estou sem perspectiva, não sei pra onde ir, não encontro a direção que devo seguir”. Estas perguntas ou afirmações são características do Ascendente, são geradas pela dificuldade em encontrar a linha do destino e o significado da existência, marcas da casa I, e por traz destes dilemas está o Medo de “não nascer”, ou o medo de morrer e o desejo de viver, muitas vezes distorcido pela educação e contaminado por modelos de vida que não coadunam com nossa essência. A posição do Sol e da Lua em nosso mapa mostra os mecanismos do desejo de viver. Apresentam os critérios e, principalmente, qual a expectativa de vida que construímos e quais as possíveis respostas do mundo exterior a essas expectativas. A posição de Saturno vai mostrar quais os mecanismo sociais que identificamos como limites para a nossa atuação, para o desenvolvimento de nosso projeto de vida; e por traz destes limites, está o constante medo de saber o que existe além deles, medo primitivo e biológico do desconhecido, medo da morte e da transformação, medo que é lapidado pela cultura para nos tornarmos cidadãos padrão e não “causarmos problemas”. Enquanto isto... Vamos deixando de cumprir nosso verdadeiro destino, vamos deixando de usufruir os talentos e dons com que a natureza nos dotou para cumprirmos nosso verdadeiro papel neste plano da existência, vamos distorcendo e reprimindo a função do signo ascendente e seus significados maiores, reduzindo muitas vezes este significado cósmico a uma mera e as vezes banal descrição de comportamentos, como por exemplo: “o ascendente é como a gente age”, “o ascendente é como a gente faz uma coisa pela primeira vez”, “o ascendente é a imagem que a pessoa apresenta para o mundo”, e todas estas descrições são as tolas colaborações reducionistas que nós astrólogos, por conivência com a pequenez, por solidariedade ao medo do que está alem dos limites, cometemos.

5 -Ascendente, - esse primeiro estágio, primeiro movimento em direção a nós mesmos e ao nosso destino - estabelece a relação espacial de nossa existência, o plano onde se desenrolam as relações humanas. Perpendicularmente a esse plano, a linha do tempo propõe uma observação da relação entre Saturno e Lua, e a dinâmica do eixo básico regido por estes dois planetas, as casas IV e X, ou Câncer e Capricórnio. O eixo do tempo se faz presente.

Aqui, superar o medo de morrer e estabelecer uma relação consciente com o tempo, viver no tempo, é condição para se permitir fluir através da espiral evolutiva que a tudo permeia, é “saber” que todas as coisas tem uma origem e uma finalidade, passado e futuro. Esta percepção nos permite enfrentar o medo de morrer e se entregar à vida, e este é o impulso mais fundamental e certamente supera em todos os seres vivos o medo da morte, afinal é a própria razão de estarmos nesta dimensão da realidade: Viver e aprender com a vida. Deixamos um pouco de lado o significado “medo” de Saturno e escolhemos instintivamente o aspecto “vida” representado pela Lua. E por fazermos esta escolha, estabelecemos uma relação intensa com todos os significados da Lua em nosso mapa , ou seja, definimos neste momento o padrão de nosso sentir, elaboramos os mecanismos básicos de defesa no sentido de manutenção e preservação da existência, criamos os “anticorpos psíquicos”, aqueles mecanismos de manutenção que vão nos defender e sustentar o padrão mental que é inserido nesta fase de nossa vida, particularmente pela mãe ou por quem faz este papel. Toda segurança que obtemos, seja na expressão da Lua, seja no contato com a mãe - sempre uma projeção e o resultado da expectativa da Lua em nosso mapa, pois é a mãe que podemos re-conhecer fora de nós - é uma base, um alicerce para a formação de nossa personalidade, são os filtros que vão definir no futuro o que pode entrar em nossa vida e o que não pode, o que ameaça e o que traz conforto e segurança, enfim, a segurança obtida neste momento é um tipo de estrutura ou de padrão ao qual nos apegamos, e do qual não pretendemos sair tão facilmente, e por isso o “medo da separação da mãe”, ou o medo de perder o contato com a Lua ou ainda, o medo de perder a conexão com os padrões de segurança e conforto que se tabulam neste momento da existência. O medo ai é lunar, um medo essencialmente ligado ao significado da lua em nosso mapa. A experiência do medo se desvincula nesse momento do comprometimento com o símbolo Saturno. Claro que se pensarmos no significado “estrutura” de Saturno e no medo de perder a estrutura, teremos que dizer que dentro da Lua existe um Saturno também, mas ai é uma elucubração astro-metafísica-semântica. Estou propondo que existe um medo típico lunar, este medo de “sair da mãe”, que é uma extensão do medo de nascer e, ao nascer, morrer para a vida perfeita que tínhamos dentro do útero, a expressão biológica do Paraíso na terra. Talvez este “medo lunar”, medo de perder as bases e romper com a proteção e conforto sugerido pela idéia de mãe, seja nosso principal e mais profundo mecanismo de resistência à transformação. Cada vez que uma situação nos ameaça e nos propõe uma mudança de padrão - sentimental, material, geográfico, etc. - apelamos para os “anticorpos psíquicos”, um conjunto de regras e crenças e argumentos cuja única finalidade é a manutenção do que está aí e a rejeição do que ainda não está aí. Por exemplo, o Ato Falho, ou certos esquecimentos suspeitos, ou quando a gente precisa tomar uma atitude solicitada pelo instinto ou pelo coração e diz: “mas isto não tem lógica!”, sendo que fazemos uma porção de coisas que não têm a menor lógica, como se apaixonar ou desejar alguém, e apenas quando precisamos de um argumento para “não fazer” usamos esta expressão com a maior cara de pau. A experiência de um contato consciente com estes significados da Lua em nosso mapa pode ser profundamente libertadora, pois é aí que se localizam nossas mais profundas defesas à transformação, e é aí que a Lua se torna oposto complementar do aspecto de Saturno que a gente mais precisa superar: o Medo.

6 - No processo de convivermos com o Medo, de enfrentarmos o Medo, de assimilarmos os significados de Saturno em nossa vida, talvez a parte mais difícil seja separar-se da mãe, como procedimento para vivenciar e unificar a oposição essencial entre a Lua e Saturno. Dentro das operações básicas da astrologia, esse ato de separar-se de um padrão de representação lunar para transformar simbolicamente a oposição Saturno-Lua em uma conjunção, exige um distanciamento crítico de uma série de atributos e significados da Lua e as configurações que a envolvem: seu signo, aspectadores, dispositor, etc.

Se separar da mãe significa abrir mão de um padrão de conforto e manutenção da personalidade que foi gestado muito cedo em nós, quando ainda nos alimentávamos no seio e no útero, e todo nosso instinto de preservação de nós mesmos resiste bravamente a isto. Biologicamente é complicado isto, e por decorrência, psicológica e emocionalmente também é. A palavra cons-ciência é oportuna neste momento. Ter consciência desta mãe que nos habita e torna-la uma aliada que nos dá a mão para que sejamos nós mesmos é um trabalho que exige coragem, mas é bastante possível, principalmente se não ficarmos usando o horóscopo para descrever e justificar e simplesmente manter o nosso nível de exigência. Mas para isto, para conquistarmos este estado consciente, precisamos “olhar nossa mãe nos olhos”, e este gesto significa aceitar um outro significado da Lua, além da criança que ela representa: a mulher.

Enfrentar esta “mulher” que nos habita é talvez o grande exercício da conquista, a maior e mais trabalhosa sedução que podemos exercer neste plano, pois é a única maneira dela nos dar a mão e tornar-se nossa aliada, tornar-se algo além de nossa mãe, tornar-se nossa companheira de verdade e andar junto de nós, lá dentro de nós, mas ao nosso lado. Olhar esta mãe nos olhos até que a aceitemos como igual, como nossa “mulher” - e isto vale para as pessoas de ambos os sexos - significa correr riscos, significa abrir mão do aspecto protetor e nutriente da mãe e aprender a conquistar isto por nós mesmos, significa perder o medo que a humanidade tem da mulher, desde Eva e seu gesto libertador, ou de Lilith e sua transgressão, ou todas as mulheres livres da historia da humanidade, todas as feiticeiras, todas as prostitutas e todas as senhoras do gozo, tão temidas por seu poder libertador, tão temidas por sua capacidade de “sair de casa” e dar a mão ao aspecto masculino de nossa personalidade, ou à criança desamparada que não quer atravessar a rua e tem medo de se perder no supermercado, tão temidas por sua capacidade infinita de amar... Muitos homens, por não terem consciência do poder de sua Lua, por não se permitirem perceber que podem abrir mão dos “anticorpos” e da necessidade uterina de cuidado, buscam em cada mulher a mãe que vai levá-los de volta ao útero e à proteção padrão, à eterna repetição do papel do menino carente.

Quanto às mulheres, por não conseguirem acessar este significado da Lua, esta outra oitava de sua energia, se mantém pequenas e ancoradas na idéia de que tem de ser mães biológicas, prisioneiras físicas da maternidade e da obrigação de serem nutridoras eternas, ao custo de perderem, ou de nunca conquistarem sua própria identidade lunar, e por isso tornam-se muitas vezes pessoas carentes de si mesmas, e se aprimoram em desenvolver sutis e refinados mecanismos de manutenção e eternização deste padrão, seja através do controle, seja através da sedução. Isto nos permite compreender um pouco a eterna insatisfação feminina, pois, como estar satisfeito se o papel que representamos por imposição cultural tantas vezes nos afasta de nosso destino e nossa essência?

A consciência lunar não precisa ser vivida necessariamente através da maternidade física. Existem infinitos planos de incorporação do símbolo, o que não descarta a necessidade biológica que a mulher tem de reproduzir para dar continuidade à vida. Isso é natural e o problema apenas surge quando o ato de gerar é uma imposição cultural e não uma necessidade do ser. E por falar em sedução, insisto em que ambos - homem e mulher - precisam seduzir esta mulher que habita nosso interior, e o método é a consciência, o caminho é parar de usar o símbolo para justificar um estado de coisas, como se a simples descrição já fosse a solução de tudo, o instrumento é ir além dos significados aceitos e estandardizados da Lua, aqueles que tantos autores coniventes com o padrão nos permitem conhecer. Chegar a estes significados é um trabalho pessoal, não está descrito simplesmente nos livros de astrologia, nem nos mais bonitos e complicados. Conquistar a consciência destes significados maiores da Lua depende de abrir mão de muitas defesas, de padrões bastante arraigados, e isto pode ser um pouco doloroso e nos colocar em uma situação temporária de insegurança e vazio, e esta situação de insegurança chama-se “Medo”. O desejo, o ato de querer esta mulher interna é um atrevimento, pois não podemos, por um princípio biológico, desejar a mãe como mulher, então, para “desejar” esta mulher que mora em nós, precisamos dar um “upgrade” nela, transforma-la simplesmente em Mulher, e este desejo - que deve ser muito, muito intenso e sincero, vai nos conduzir a conquista “dela”, e a possibilidade de tê-la ao nosso lado, e não mais “pairando” sobre nós ou fora de nós. Enamorar-se da Lua, parece uma banal figura poética, mas é um ato de libertação profunda, é o caminho para a possibilidade de nos transformarmos e sermos nós mesmos e, finalmente, entrarmos em sintonia com nosso próprio destino e projeto de vida, e não mais a sintonia com a segurança e eterna estabilidade que nos foi apresentada. Este desejo é fundamental. Está dentro de nós a capacidade de desejar e querer essa mulher, como em algum momento tivemos desejo pelo seio da mãe. É apenas uma mudança de oitava, uma mudança de compreensão do que devemos fazer para seguirmos em direção a nós mesmos, para vencermos os limites de Saturno e ingressarmos em uma realidade transpessoal. E este desejo, o gesto do desejo pela própria alma, pela Lua, produz uma substancia misteriosa, um tipo de endorfina do espírito e da consciência, um fluido mágico que pode nos conduzir aos confins do universo e aos confins de nós mesmos e esta substância é o que muitas vezes chamamos de amor, a própria essência do Amor.

Nenhum comentário:

Postar um comentário